A crise da habitação nas cidades portuguesas obriga arquitetos, industriais e académicos a acelerar a construção de casas e passar da aplicação pontual de soluções inovadoras e sustentáveis para a produção em grande escala. As principais conclusões do primeiro “Shift – Arquitetura e Sustentabilidade”, na Casa da Arquitetura, apontam o caminho a trilhar e a avaliar na próxima edição do seminário internacional, em 2024.
“Conseguimos ver e sentir que é um caminho que, afinal, está muito no início”, partilha Nuno Sampaio, diretor-executivo da Casa da Arquitetura. “As apresentações que se fizeram são ainda soluções quase de caso a caso. Há necessidade de continuar a investir e a investigar, para que seja cada vez mais próxima esta ligação entre quem produz materiais, quem constrói e quem projeta. Esse para mim foi talvez o resultado mais claro do seminário”, acrescenta.
A crise da habitação, plasmada pelos milhares de pessoas que se manifestaram nas principais cidades portuguesas no último fim de semana, pressiona o setor da construção a procurar novas respostas para o problema.
“Temos de ser mais rápidos a conceber, precisamos com urgência de sair do caso de exceção para passarmos à regra”, sublinha Nuno Sampaio. “E entender como podemos construir em cidades, por exemplo, num modelo de urgência, produzir soluções que se possam aplicar em larga escala e como essa construção pode ser mais sustentável do que é”, detalha.
A pressão para encontrar soluções mais eficientes é uma preocupação partilhada por todos os atores do setor, conscientes do desafio que têm pela frente. “Se não tivermos capacidade de produzir para perdurar, o esforço que teremos de fazer na reutilização e na circulação, que já é muito grande, será ainda maior”, alerta o diretor-executivo da Casa da Arquitetura.
“As soluções têm que, em primeiro lugar, ter capacidade de ser aplicadas em larga escala; segundo, têm de durar; terceiro, têm de proporcionar uma vida útil do edifício com poucos recursos, quer na manutenção, quer na utilização e nas energias”, estabelece o arquiteto.
Balanço muito positivo
Paulo Moreira, arquiteto curador do “Shift – Arquitetura e Sustentabilidade”, dedicado à temática da “Arquitetura Material”, faz um balanço “muito positivo” do seminário, do conteúdo, dos contributos e do número de pessoas que assistiram aos trabalhos. “Houve muita participação em todos os painéis de debate, com muitas perguntas. Tivemos vários debates que se estenderam para além da hora. Esteve um público realmente muito interessado”, avalia à Smart Cities, revista parceira do evento.
“A decisão de abrir os debates à diversidade de participantes e de oradores resultou. Os debates foram disputados, houve até alguma controvérsia e trocas de ideias, às vezes, distintas. É nesse confronto que surgem as ideias e que se pode avançar com soluções e aprendizagens”, adianta Paulo Moreira.
A experiência valida a necessidade de refletir sobre temas que raramente são abordados. “Por exemplo, a questão da desconstrução. Por que não pensar que a desconstrução da arquitetura é uma área sobre a qual os arquitetos também podem debruçar-se?”, questiona o curador do seminário. “Foi interessante ouvir esta ideia de desconstrução e de separação dos materiais, seletivamente; a ideia de separar componentes, estudar em diagnósticos e perceber o que pode ser reaproveitado. Tudo isto são temas que raramente se abordam no âmbito da arquitetura”, explica.
“Os materiais não têm de ser infinitamente produzidos, como novos, mas o que existe pode ser, muitas vezes, desmantelado. Falou-se de desconstrução mais do que de demolição, a demolição destrói os materiais e depois não podem ser reaproveitados”, conclui.
O “Shift – Arquitetura e Sustentabilidade” teve o apoio do Ministério do Ambiente e da Ação Climática.